Ana Lia Branchi
Em uma tarde, em nossa sala, no edifício da Antiga Metalúrgica Abramo Eberle, na Sinimbu, trabalhávamos no documentário “Honra do Trabalho”, assistindo aos vídeos das entrevistas para fazer a “decupagem”.
Em uma das entrevistas, o ex-funcionário da Eberle relembrava, com emoção, das portas que havia na entrada do edifício. Nelas, descrevia, havia ornamentos, espécies de sereias e outros detalhes em bronze, que ele havia ajudado a confeccionar com seu ofício de gravador. Tão logo terminou a história, surgiu o questionamento se as portas ainda estariam ali.
No intervalo, decidi sair do prédio para comprar um lanche. Na volta, caminhei pela calçada de pedras portuguesas com engrenagens desenhadas, que faz parte da edificação. Fui observando cuidadosamente a fachada para ver se encontrava a porta. Não encontrei. Soubemos que existe a possibilidade de ela estar ainda ali, tapada por tapumes. Mas esta será outra história a ser contada neste blog.
Caminhando, seguia o movimento das engrenagens. Quando tudo parecia fluir, enguicei. Foi no momento exato em que avistei uma plaqueta na fachada. O conteúdo daquele elemento funcionou como uma trava no sistema. Parei. E tirei uma foto:
Em um primeiro momento choquei com a pichação na plaquinha, justo neste elemento que identifica aquela edificação como patrimônio histórico municipal. Corri para mostrar a fotografia aos colegas.
Em um segundo momento, já com os colegas, a sensação que tive era maior do que o choque ao ver os danos na placa. Percebi que a palavra que estava pichada era “BANG”. Bang? Seria bang de explosão? Big bang? Bang-bang? Tiros, faroeste. Por que "bang"?
Fiquei preocupada, me perguntei se a comunidade caxiense estaria valorizando este bem. Este edifício, testemunho físico do que esta empresa representou para Caxias do Sul. É melhor que a comunidade queira manter e valorize seus bens para conservá-los. Mas e o “bang”? Seria um sinal de esquecimento e abandono? Será que ele é indiferente, será que tanto faz se “bang” com ele?
Acho que não. Muitos caxienses tem uma ligação com a Metalúrgica. Quem não tem um conhecido ou parente que tenha trabalhado na Eberle e se orgulha disso? Quem que na infância não olhava aquela “casinha” lá em cima e fantasiava histórias sobre o que havia lá dentro? E as badaladas do relógio? Muitos recordam com alegria das vitrines tão bonitas que vinha gente de fora para passear e admirá-las. São mais lembranças do que podemos imaginar.
Analisando a plaquinha, que textos sobram visíveis? A palavra patrimônio e a frase “Inscrita no Livro Tombo do Município de Caxias do Sul em 06 de janeiro de 2006. As demais palavras, um breve histórico, foram “explodidas”. Ou não...
Isso depende do ângulo em que se analisa. Se pensarmos por outro lado, quem sabe a palavra bang não foi escrita ali para chamar a atenção? Pesquisei em um dicionário de inglês para saber os significados dela. Associada a outras, formava muitas expressões: to bang up - causar dano; to bang about - causar tumulto ou fazer muito barulhos sobre algo; to bang into your heads – meter nas suas cabeças;
Nós, idealizadores deste documentário, propusemos com ele que com ele haja um “bang” no assunto da metalúrgica Abramo Eberle, ainda mais agora que a edificação foi vendida. Vamos “meter nas nossas cabeças” que precisamos “fazer barulho” sobre este assunto, pois não sabemos exatamente qual será o destino deste bem. Se será mantido, demolido, se seu uso valorizará o nosso passado com vistas ao presente e para o futuro, se vai auxiliar a conservar o bem ou descaracterizá-lo e depredá-lo ainda mais.
O documentário “A Honra do Trabalho” tem o objetivo de resgatar a memória imaterial da Eberle, e assim valorizar a material. Este blog tem o intuito de divulgar o projeto, e de contar com a participação da comunidade, contando suas histórias, enriquecendo a pesquisa e dando apoio à conservação do edifício.
Este texto pretende ser um “bang” na questão do apoio à preservação do edifício da Antiga Metalúrgica Eberle. Uma espécie de tiro ou estouro para chamar a atenção à destinação do edifício. Auxiliar a "apagar" a pichação da plaqueta para deixar a mostra não só a história antiga do edifício, mas a história que construiremos a partir deste novo momento.