sábado, 19 de janeiro de 2013

Patrimônio Industrial

Elisabete Souza Silva

Adquirido recentemente por um grupo de investidores caxienses, o prédio da antiga Metalúrgica Abramo Eberle será transformado num centro comercial. Tombado em janeiro de 2006 pelo patrimônio histórico municipal, o conjunto de prédios em alvenaria, construídos entre os anos de 1930 a 1950, onde se destaca aquele que tem a fachada para a Rua Sinimbu,  é um autêntico exemplar da arquitetura modernista industrial e elemento integrante da paisagem urbana, da história e da identidade de Caxias do Sul. Atualmente, parte dos prédios abrigam um estacionamento, uma loja de brinquedos e a Faculdade Inovação, enquanto o restante está abandonado há mais de 10 anos. 
Os edifícios do patrimônio industrial são potencialmente “reutilizáveis” pelas suas características espaciais, a amplitude e a relativa versatilidade, pois são facilmente adaptáveis e se prestam à múltiplos usos. O potencial especulativo que reside no valor imobiliário dos terrenos, geralmente em posições estratégicas e dotadas de ampla infraestrutura, fazem com que, em muitos casos, as edificações sejam encaradas principalmente pelo potencial econômico, muito mais que pelo potencial sócio-cultural. Esses fatores acabam por levar a um afastamento do debate do foro cultural, que de início motiva a preservação, para um âmbito diverso que assume proporções desequilibradas, de pressões econômicas, utilitárias e políticas, que não podem ser desconsideradas na preservação, mas também não podem ser as únicas e preponderantes.
O reconhecimento de bens industriais como patrimônio a ser preservado é importante para a construção da memória social e de identidade local, particularmente da memória do trabalho, por isso, pesquisadores têm se empenhado em mostrar como os bens materiais e imateriais produzidos pelas indústrias são importantes para se entender, não só a dinâmica da produção material, mas também as relações históricas e sociais que se desenvolveram em torno delas, possibilitando a constituição de uma representação que sintetize materialmente o processo histórico, fator essencial para fornecer ao cidadão uma forma de perceber o passado como um tempo integrante de sua vida.
Mesmo com o avanço nos debates, a preservação do patrimônio industrial pelos órgãos responsáveis, tanto nas esferas municipal, estadual e federal, ainda é incipiente no Brasil e os órgãos de proteção ao patrimônio não conseguem se antecipar à destruição desses bens. Geralmente quando começam a ser estudados já estão abandonados (por falta de função, falência ou longos processos judiciais), sem maquinaria, com muitas modificações sofridas ao longo dos anos e nem sempre documentadas. Mas é importante não confundir preservação com conservação dos bens culturais tombados, muitos estão preservados, mas em condições de conservação muito precárias ou em ruínas.
Atribuir novos usos à edificações tombadas é um importante recurso para favorecer a conservação, pois o abandono e a falta de uma destinação útil à sociedade são as principais causas da degradação de um bem, mas, a nova função deverá ser compatível com as características do monumento e permitir a permanência de seus atributos históricos, estéticos e memoriais, elementos que efetivamente o configuram como patrimônio cultural. Preservação, conservação e restauração devem, por definição, estar vinculadas a ações culturais. Assim, questões de ordem prática, de uso e de exploração econômica, nunca seriam determinantes para decisões de preservação. 
A grande questão não é tanto a destinação, mas como é feita essa adaptação para o novo uso. As intervenções têm que ser feitas mediante um bom e detalhado projeto de arquitetura que leve em conta as especificidades do edifício antigo, que deve ser o foco central e não um mero "detalhe pitoresco". Os instrumentos teórico-metodológicos e técnico-operacionais da restauração que são aplicáveis na prática, tem o objetivo de fazer com que os bens sejam usufruídos no presente e transmitidos ao futuro, com pleno respeito pelos seus aspectos materiais, documentais, pelas suas várias estratificações e pelas próprias marcas da passagem do tempo, sem desnaturá-los nem falseá-los, visto que alguns edifícios nada revelam ao cidadão comum sobre a antiga função e para que os bens culturais possam continuar a serem efetivos e fidedignos suportes da memória coletiva.
Dessa forma, o patrimônio industrial vem sendo objeto de adaptações a diversos usos: como escritórios, restaurantes, mercados, centros culturais, centros esportivos, hotéis, habitações, dentre outros, demonstrando uma intensa viabilidade econômica. Porém essa adaptação deve ser uma justaposição e jamais como eliminação ou substituição de documentos históricos para forçar uma nova realidade totalmente diversa daquilo que lá existe. Deve sempre ser ato de reinterpretação do presente, de maneira socialmente e culturalmente responsável, uma renovada forma de se relacionar com um monumento histórico, voltado para sua transmissão para as próximas gerações, uma ação que mantém sempre o futuro no horizonte de suas reflexões. 

Abaixo destaco obras que ilustram a reutilização de antigos edifícios industriais:

Gasômetro de Viena 
Foi construído um grande shopping center que atravessa os dois primeiros níveis dos quatro gasômetros, 600 apartamentos e cerca de 250 residências estudantis, combinados com escritórios, repartições da prefeitura, garagens, um complexo de cinemas, além de uma grande arena para shows com capacidade para 3000 pessoas no subsolo de um dos cilindros.


Gasômetro de Viena Fonte: Google


Tate Modern 
Os arquitetos utilizaram o antigo prédio da estação de energia elétrica Bankside Power Station como base para a construção da Tate Gallery, que serviria entre outros motivos para abrigar seu enorme acervo. Todos os maquinários foram retirados e foram feitas várias demolições internas para abrigar a nova função.



Tate Modern Fonte: Google

SESC Pompéia
Os galpões da antiga Fábrica de Tambores da empresa alemã Mauser & Cia, foram adaptados para atividades culturais como exposições, biblioteca, área de leitura, estar, jogos, salas para oficinas, restaurante/casa de shows e teatro. Posteriormente foi construído o complexo esportivo e um grande cilindro de setenta metros de altura, a torre da caixa d’água, em alusão à chaminé que foi demolida pelo próprio SESC.


SESC Pompéia Fonte: Google

Bangu Shopping
A instalação da antiga Fábrica de Tecidos Bangu, com terreno aproximado de 140.000 m² deu lugar a construção do Shopping Bangu, com espaço para 200 lojas de diversos tamanhos, praças de alimentação com cerca de 1000 lugares e estacionamento para 2.500 vagas, além de um teatro e um museu.


Bangu Shopping Fonte: Google

Moinho da Estação
A área que abrigou o antigo Moinho Sul-Brasileiro abriga um centro de lazer, cultura e serviços, composto de 34 salas, onde funcionam bares, escolas de dança, de idiomas, ateliês de fotografia, design e arquitetura, comércio de arte e artesanato, entre outros.


Moinho da Estação Foto: Elisabete Souza

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