Aline Marques de Freitas
Há
116 anos, Dr. Júlio de Castilhos, presidente do estado do Rio Grande do Sul,
visitou a então Vila de Caxias e admirado pelo progresso apresentado em pouco
mais de 20 anos de sua existência, definiu-a como “A Pérola das Colônias”. Sim,
em 1897, passados 22 anos do início da colonização italiana no Rio Grande do
Sul, Caxias se destacava pela sua urbanização eminente, a pavimentação das
ruas, a organização das praças, além disso, hotéis, cafés, casas de negócios de
secos e molhados, edificações públicas, e pequenas indústrias prosperavam. Já
figurava nos jornais da época a preocupação com a construção de estradas para
escoamento da produção industrial. A que se deveu todo esse progresso destacado
na frase de Júlio de Castilhos? Essa pergunta é retórica para os conterrâneos.
É de senso comum que foi o trabalho duro dos colonos que aqui chegaram o
responsável pelo crescimento econômico.
Surpreende
ao desavisado que uma colônia pensada para vocação agrícola acaba apresentando
uma considerável urbanização em pouco tempo. O que levou a isso? O produto
agrícola precisa ser vendido, e o comércio ocorre na cidade, sim, mas apenas
isso não explica. É preciso prestar atenção no trabalho que o colono traz
consigo na bagagem, e como ele aplica esse conhecimento aqui. Muitos do que
aqui chegam pretendiam morar na vila, mas grande parte seguiu para as colônias.
Aqueles que vão para a colônia e se dedicam ao plantio da uva, logo se uniam criando
cooperativas vitivinícolas. Queriam fazer do seu trabalho um negócio.
É preciso observar que havia em Caxias uma
estreita
relação entre produção e comércio, não existia ainda uma separação clara entre
produção e venda dos produtos. Os sapateiros, mestres no conserto e na produção
de calçados, ainda vendiam seus sapatos. As selarias produziam e vendiam os
couros, os fabricantes de móveis produziam e vendiam cadeiras. A casa funerária
fabricava os caixões e vendia aos interessados. Era feita diretamente ao
consumidor, o que não excluía as vendas no atacado. Em 1915 a existência de
vários estabelecimentos industriais garantia grande diversidade na produção.
Havia empresas modernas como a metalúrgica e as tradicionais de consumo.” (GIRON;
BERGAMASCHI, 2001. p. 106)
A
indústria nasce ligada ao comércio, da mesma forma que é possível afirmar que o
comércio nasce ligado à produção manufatureira. E, pelo menos até meados de
1920, a grande maioria das fábricas está estreitamente ligada à agricultura.
Nesse
contexto a história da metalúrgica Eberle é a história do crescimento da cidade
e é a história dos cidadãos caxienses. A
metalúrgica nasce da pequena funilaria pertencente à Elisa Bandeira. Elisa
emigra da Itália com seu marido, José Eberle, que trabalhara na Itália em
fábricas de funilaria e alambiques e trouxe consigo alambiques e ferramentas
para abrir um pequeno negócio. Quando chegam aqui, José compra uma colônia e
passa a se dedicar à produção agrícola, e sua mulher compra uma funilaria e
abre seu negócio na vila. Gigia, como era conhecida Elisa, produz e vende seus
artigos de funilaria, de 1886 a 1896. Seu filho Abramo, assume o negócio e em
1904 a funilaria passa a se chamar Abramo Eberle & Cia. Abramo, que fica no
comando até sua morte em 1945, diversifica o leque fabril, produzindo de
talheres a artigos sacros e até motores (devido à dificuldade de importar
durante a Segunda Guerra Mundial). É nos tempos de Abramo que a cidade
incorpora os valores da indústria: se o tempo é o tempo da fábrica, em Caxias o
tempo é marcado pelo sino do Abramo. Assim também a metalúrgica se torna
exemplo a ser seguido devido à sua fama, tanto pela qualidade de seus produtos
quanto pelo tratamento dado a seus operários.
Historicamente,
a identidade do povo caxiense foi construída ligada à ideia de que “aqui se
trabalha”, e que é devido a esse trabalho que se tem progresso econômico. E se
essa identidade pode de alguma forma ser materializada, ela o é, na metalúrgica
Eberle “porque aqui vive-se do trabalho, e melhor que Eberle ninguém para
expressar o trabalho e a vida verdadeira” (jornal O Momento, 18 de maio de
1946).
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