sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A expressão do trabalho caxiense


Aline Marques de Freitas


Há 116 anos, Dr. Júlio de Castilhos, presidente do estado do Rio Grande do Sul, visitou a então Vila de Caxias e admirado pelo progresso apresentado em pouco mais de 20 anos de sua existência, definiu-a como “A Pérola das Colônias”. Sim, em 1897, passados 22 anos do início da colonização italiana no Rio Grande do Sul, Caxias se destacava pela sua urbanização eminente, a pavimentação das ruas, a organização das praças, além disso, hotéis, cafés, casas de negócios de secos e molhados, edificações públicas, e pequenas indústrias prosperavam. Já figurava nos jornais da época a preocupação com a construção de estradas para escoamento da produção industrial. A que se deveu todo esse progresso destacado na frase de Júlio de Castilhos? Essa pergunta é retórica para os conterrâneos. É de senso comum que foi o trabalho duro dos colonos que aqui chegaram o responsável pelo crescimento econômico.

Surpreende ao desavisado que uma colônia pensada para vocação agrícola acaba apresentando uma considerável urbanização em pouco tempo. O que levou a isso? O produto agrícola precisa ser vendido, e o comércio ocorre na cidade, sim, mas apenas isso não explica. É preciso prestar atenção no trabalho que o colono traz consigo na bagagem, e como ele aplica esse conhecimento aqui. Muitos do que aqui chegam pretendiam morar na vila, mas grande parte seguiu para as colônias. Aqueles que vão para a colônia e se dedicam ao plantio da uva, logo se uniam criando cooperativas vitivinícolas. Queriam fazer do seu trabalho um negócio.

 É preciso observar que havia em Caxias uma

estreita relação entre produção e comércio, não existia ainda uma separação clara entre produção e venda dos produtos. Os sapateiros, mestres no conserto e na produção de calçados, ainda vendiam seus sapatos. As selarias produziam e vendiam os couros, os fabricantes de móveis produziam e vendiam cadeiras. A casa funerária fabricava os caixões e vendia aos interessados. Era feita diretamente ao consumidor, o que não excluía as vendas no atacado. Em 1915 a existência de vários estabelecimentos industriais garantia grande diversidade na produção. Havia empresas modernas como a metalúrgica e as tradicionais de consumo.” (GIRON; BERGAMASCHI, 2001. p. 106)

A indústria nasce ligada ao comércio, da mesma forma que é possível afirmar que o comércio nasce ligado à produção manufatureira. E, pelo menos até meados de 1920, a grande maioria das fábricas está estreitamente ligada à agricultura.

Nesse contexto a história da metalúrgica Eberle é a história do crescimento da cidade e é a história dos cidadãos caxienses.  A metalúrgica nasce da pequena funilaria pertencente à Elisa Bandeira. Elisa emigra da Itália com seu marido, José Eberle, que trabalhara na Itália em fábricas de funilaria e alambiques e trouxe consigo alambiques e ferramentas para abrir um pequeno negócio. Quando chegam aqui, José compra uma colônia e passa a se dedicar à produção agrícola, e sua mulher compra uma funilaria e abre seu negócio na vila. Gigia, como era conhecida Elisa, produz e vende seus artigos de funilaria, de 1886 a 1896. Seu filho Abramo, assume o negócio e em 1904 a funilaria passa a se chamar Abramo Eberle & Cia. Abramo, que fica no comando até sua morte em 1945, diversifica o leque fabril, produzindo de talheres a artigos sacros e até motores (devido à dificuldade de importar durante a Segunda Guerra Mundial). É nos tempos de Abramo que a cidade incorpora os valores da indústria: se o tempo é o tempo da fábrica, em Caxias o tempo é marcado pelo sino do Abramo. Assim também a metalúrgica se torna exemplo a ser seguido devido à sua fama, tanto pela qualidade de seus produtos quanto pelo tratamento dado a seus operários.

Historicamente, a identidade do povo caxiense foi construída ligada à ideia de que “aqui se trabalha”, e que é devido a esse trabalho que se tem progresso econômico. E se essa identidade pode de alguma forma ser materializada, ela o é, na metalúrgica Eberle “porque aqui vive-se do trabalho, e melhor que Eberle ninguém para expressar o trabalho e a vida verdadeira” (jornal O Momento, 18 de maio de 1946). 

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